Forças de Páz - Suez, Timor Leste e Haiti

Missões de Páz do Brasil
Baseada nos preceitos do artigo 4º da Constituição Federal, a participação brasileira em missões de paz só ocorre após o atendimento de algumas imposições, cuja principal é a aceitação, por parte dos países ou das facções envolvidas no conflito, da presença de observadores ou tropas estrangeiras em seu território.
Essa conduta da política externa brasileira vem sendo adotada há longo tempo. Assim, a primeira participação do Exército Brasileiro ocorreu em 1947, quando observadores militares foram enviados para os Balcãs. Durante as décadas de 50 e 60, viria a participar com efetivos maiores, integrando forças internacionais de paz, sob a égide da Organização das Nações Unidas (ONU) no Oriente Médio e da Organização dos Estados Americanos no Caribe. A mais longa missão foi no Oriente Médio (UNEF) e durou de 1957 a 1967, com a participação de 600 homens, em média, que se revezaram em 20 contingentes.
 
Nas décadas seguintes, foram bastante reduzidas as missões, até reiniciarem em 1989, quando inúmeras foram abertas. Em 1994, foram enviadas tropas (uma companhia) para auxiliar a manutenção da paz em Moçambique. Em setembro de 1995, o Exército enviou para Angola um contingente composto por mais de mil homens (um batalhão, uma companhia de engenharia e um posto de saúde). Nos últimos anos, militares brasileiros vêm prestando serviços às Nações Unidas, como observadores, na África, na América Central, na Europa, e na Ásia, e cooperando para a solução pacífica do conflito fronteiriço entre o Equador e o Peru.
A par do excelente desempenho demonstrado pelas tropas e pelos observadores brasileiros em missões no exterior, o Exército tem participado de exercícios conjuntos com outros países.
A participação em missões de paz vem trazendo crescente prestígio à política externa e ao Exército Brasileiro, aumentando a projeção nacional no cenário mundial.
 
A Política Externa Brasileira para Operações de Paz
Fundamentada na Política de Defesa Nacional, consoante a diretriz de participar de Operações Internacionais de Paz, de acordo com os interesses brasileiros, pautada pelas seguintes linhas gerais:
 
Os Princípios das Operações de Paz
O Brasil considera que as Operações de Paz são instrumentos úteis para solucionar conflitos e ajudam a promover negociações político-diplomáticas, mas não podem substituí-las; a solução definitiva sempre dependerá da vontade política das partes.
Quando instaurada, uma Operação de Paz deve ser regida pelos princípios de imparcialidade, aplicação do mínimo de força necessária, negociação com todas as partes envolvidas e intermediação na busca de soluções, evitando-se a discussão de problemas e responsabilidades.
 
Experiências Brasileiras em Operações de Paz
O Brasil, há muito tempo, vem contribuindo com o esforço de organismos internacionais de paz, quer pelo envio de observadores militares desarmados, quer pela inserção de tropas levemente armadas nas áreas conflagradas. Os objetivos têm sido monitorar o cessar-fogo entre as partes envolvidas e desenvolver as melhores condições para o pleno restabelecimento da paz regional.
 
Exercícios Conjuntos
Exercício Forças Unidas – O exercício inicialmente denominado Forças Unidas foi estruturado num quadro de Força de Paz, realizado numa situação hipotética e com auxílio de computadores. No decorrer do exercício, são simulados incidentes que envolvem a tropa, civis e demais participantes na questão. Nos primeiros dias são realizados seminários com diferentes temas sobre assuntos correlatos com a ONU e Operações de Manutenção da Paz. O exercício é patrocinado pelo Comando Sul do Exército dos Estados Unidos da América (EUA).
Em 1997, o exercício foi realizado na Escola de Comando do Estado-Maior do Exército (ECEME). O Exército Brasileiro realizou toda a coordenação, planejamento e desenvolvimento do evento, baseado na experiência vivida em Angola.
Em 1999 o exercício passou a ser chamado SUR 99, e foi realizado na capital boliviana segundo uma situação planejada pelo Comando Sul do Exército dos EUA.
Em substituição ao exercício Forças Unidas, que passou a ser bianual, em 2000 foi realizado um simpósio de Forças de Paz em Santiago do Chile.
Operação Cruzeiro do Sul – Em 1996, foi criado um exercício denominado Operação Cruzeiro do Sul, por iniciativa da Argentina, com os objetivos de proporcionar um maior entrosamento entre os integrantes de uma Força de Paz Combinada (F Paz Cbn) e desenvolver o planejamento de estado-maior nos níveis grande unidade (GU) e unidade (U), reforçando os laços de amizade no contexto do MERCOSUL. Em 1997, contando com a participação do Uruguai, o exercício foi realizado no Brasil, com a presença de tropa no terreno. Em 1998, o exercício foi de quadros, realizado na Argentina, com a inclusão do Paraguai.
Em 1999, foi realizado no Brasil, e constou de seminários com o objetivo de trocar experiências relativas às operações de manutenções de paz e planejamento nos níveis GU e U. Pode-se observar a diferença entre o SUR 99 e a Operação Cruzeiro do Sul: o primeiro constitui comando de brigada e o segundo comando regional, de acordo com o desdobramento das Forças da ONU em Angola. No ano 2000 o exercício foi de posto de comando com incidentes.
Exercício de Apoio Humanitário – Ainda em 1998, por ocasião de uma conferência bilateral de estados-maiores entre os Exércitos do Brasil e da Argentina, foi estabelecido que seria realizado, anualmente e por revezamento, um exercício combinado de apoio humanitário às comunidades por ocasião de desastres naturais.
Em 1999, o exercício denominado Operação Iguaçu – I foi realizado na cidade de Posadas, na Argentina, contando com a presença de militares do 2º Regimento de Cavalaria Mecanizado e do estado-maior da 1ª Brigada de Cavalaria Mecanizada, explorado sob o tema de um alagamento generalizado na fronteira comum, operacionalizando a assistência humanitária.
Seminários – Nos anos de 1997 e 1998, o Exército participou de seminários de assuntos relacionados com Operações de Manutenção da Paz, na América do Sul e Grã-Bretanha.
Em 1999, foi realizado um intercâmbio de especialistas em operação de manutenção de paz com o Exército dos Estados Unidos da América. Foram discutidos temas como desminagem, relacionamento com organizações não-governamentais (ONG) e conceitos doutrinários.
O preparo da tropa – Uma situação real – O Comando de Operações Terrestres (COTER) é responsável pelo preparo das tropas que se destinam às missões de manutenção da paz. São tomadas como referências de preparo as Diretrizes da ONU e os Programas Padrão de Instrução, entre outros documentos. O tempo previsto é de cerca de três meses, dividido em instrução individual (quadros, cabos e soldados) e adestramento.
 
Perpectivas
Em âmbito internacional – A tendência aponta para a concessão, pela ONU, de mandatos para que organismos regionais conduzam operações de manutenção de paz, com o provável aumento de missões delegadas para coalizões de estados-membros, como foi o caso da missão junto à INTERFET; ou para organismos regionais, com a conseqüente diminuição do controle das operações por parte das Nações Unidas.
Em curto e médio prazos, pode-se dizer que, em razão do seu alto custo e das dificuldades de atingir resultados definitivos, as missões de paz da ONU, envolvendo emprego de tropa, deverão diminuir. Por outro lado, as missões de emprego individual – observadores militares – por enquanto, não deverão sofrer redução.
As Nações Unidas, por sua universalidade, legitimidade e experiência de mais de 50 anos em missões congêneres, devem continuar, quando possível, a conduzir as operações de manutenção de paz.
 
Específicas para a Força
O emprego de forças militares em Operações de Paz continuará a ser uma constante nos próximos anos. O Brasil poderá ser convocado a dar sua parcela de contribuição
 
DIVISÃO DE MISSÃO DE PAZ
A Divisão de Missão de Paz (Div Mis Paz) inicialmente chamava-se Centro de Preparação e Avaliação para Missões de Paz do Exército Brasileiro (CEPAEB), que foi criado através da Portaria nr 094, de 12 de março de 2001, do Comandante do Exército, que determinou a sua subordinação ao Comando de Operações Terrestres (COTER), integrando a 1ª Subchefia, encarregada do Preparo da Força Terrestre.

Com a criação do Centro de Instrução de Operações de Paz (C I Op Paz) em 2005 na cidade do Rio de Janeiro - RJ, a Div Mis Paz passou gradualmente as missões de instrução e preparo para aquele novo Centro, cabendo precipuamente à Div Mis Paz, dentre outras, as atividades de mobilização da tropa, orientações para o preparo, acompanhamento e apoio das missões de paz em andamento, planejamento de novas missões de paz, propostas doutrinárias e desmobilização da tropa.

Em 2006, a Div Mis Paz foi transferida para a 3ª Subchefia e no final desse ano o CEPAEB foi definitivamente extinto do Quadro de Cargos Previstos (QCP) do COTER.

A Div Mis Paz é resultado de medidas e diretrizes emanadas do Comando do Exército que visam a dotar o Exército Brasileiro de estruturas adequadas à participação eficiente em missões de paz, em função do longo histórico da Força Terrestre, de participações bem sucedidas em missões desta natureza, desde a década de 1940, com observadores militares, e desde a década de 1950, com tropa.
Criado inicialmente como um centro virtual de preparo e de acompanhamento doutrinário, a Div Mis Paz hoje também é o organismo onde se concentram os esforços e a coordenação logístico-administrativa dos contingentes e das missões individuais, após a criação do Grupo de Acompanhamento e Apoio às Missões de Paz no Âmbito da Força Terrestre (GAAPAZ).
 
CENTRO CONJUNTO DE OPERAÇÕES DE PAZ DO BRASIL (CCOPAB)



Inicialmente, quando os primeiros contingentes de tropa brasileira foram desdobrados para o emprego em missões fora do país, coube aos próprios sua preparação. Posteriormente, a 5ª Subchefia do Estado-Maior do Exército ficou encarregada de planejar esses treinamentos e adestramentos.
Desde os primeiros desdobramentos de tropa coube aos contingentes designados a condução de seu respectivo preparo. Posteriormente , a 5ª Subchefia do Estado-Maior do Exército passou a orientar o preparo da tropa. Em 2001 foi criado, na Divisão de Missão de Paz do COTER, o Centro de Preparação e Avaliação para Missões de Paz do Exército Brasileiro (CEPAEB), com a missão de orientar o preparo de todos os militares brasileiros designados para integrarem Missões de Paz.
A Resolução 44/49, da Assembléia Geral das Nações Unidas – ASNU, de 08 de dezembro de 1989, sobre a “Revisão Abrangente da Questão das Operações de Paz em Todos os seus Aspectos”, encorajou os Estados-Membros a organizarem-se no estabelecimento de programas de treinamento para militares e pessoal civil, tendo em vista seu emprego em operações de paz. A reunião, homônima, do IV Comitê da ASNU, ocorrida em 04 de outubro de 2005 – na qual discursou o Conselheiro Militar da Missão Permanente do Brasil junto à ONU, em Nova Iorque, aprofundou a questão e enfatizou o compromisso de futuro dos diversos Estados-Membros para com os aspectos específicos do treinamento para as operações de paz. Em decorrência desses eventos e em face da crescente mobilização internacional dos países-membros no sentido de criar estruturas que possibilitem a prática e a disseminação dos procedimentos e normas vigentes nas missões de paz, o Exército Brasileiro, o mais expressivo tributário no âmbito da Forças Armadas Brasileiras este tipo de missão, criou, por meio da Portaria do Comandante do Exército Nr 090, de 23 de fevereiro de 2005, o Centro de Instrução de Operações de Paz.
Como conseqüência do compromisso internacional recentemente assumido relativo à Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti (MINUSTAH), o CI Op Paz iniciou suas atividades com a incumbência de conduzir o preparo da então Brigada Haiti, 3º Contingente, integrada pelo GUEs - 9ª Bda Inf Mtz, instalando-se provisoriamente no aquartelamento do 57º BI Mtz (Es) / REI, a unidade base do Batalhão Haiti.
Dessa forma, após a criação do CI Op Paz, os contingentes, a partir do terceiro, inclusive, passaram a preparar-se e a serem empregados sob a luz do Cap. 7 da carta das Nações Unidas, coerente com o mandato da MINUSTAH, produzindo significativas modificações no comportamento das tropas no terreno.
Em 15 de junho de 2010, a portaria nº 952-MD, de mesma data, designa o Centro de Instrução de Operações de Paz (CIOpPaz), do Exército Brasileiro para a preparação de militares e civis brasileiros e de nações amigas a serem enviados em missões de paz e altera a sua denominação, para Centro Conjunto de Operações de Paz do Brasil (CCOPAB).
 
Missão de Paz Canal de  Suez





Primeira Força de Emergência das Nações Unidas - UNEF I
A primeira experiência histórica das Forças Armadas brasileiras em missão de paz das Nações Unidas foi o envio do "Batalhão Suez", um Batalhão de Infantaria de aproximadamente 600 homens ao Egito (de janeiro de 1957 a julho de 1967) integrando a Força de Emergência das Nações Unidas I (UNEF I), organizada com a finalidade principal de separar forças egípcias e israelenses.
    A Missão foi criada para proteger e supervisionar a cessação das hostilidades, incluindo a retirada das forças armadas da França, de Israel e do Reino Unido do território egípcio e, após a retirada, para servir como um amortecedor entre forças egípcias e israelenses. Os seguintes países forneceram tropas para UNEF I: Brasil, Canadá, Colômbia, Dinamarca, Finlândia, Indochina, Índia, Noruega, Suécia e Iugoslávia.
   A atuação da UNEF I no Egito foi dividida em quatro fases: a primeira fase centrou-se na retirada das forças anglo-francesas da área de Port Said; a segunda diz respeito à retirada das forças israelenses da península do Sinai; a terceira centrou-se na retirada das forças israelenses da Faixa de Gaza e da região de Sharm-el-Sheikh (faixa na costa ocidental do Golfo de Aqaba que, atualmente, assegura a liberdade de navegação no Estreito de Tiran e no Golfo); e a quarta e última fase, que começou com a implantação de UNEF ao longo das fronteiras entre o Egito e Israel, abrangeu um período de mais de 10 anos, a partir de março 1957 até meados de 1967, quando a Força atuou como um tampão informal entre as forças egípcias e israelenses ao longo da Linha de Demarcação de Armistício, para observar e informar sobre todas as violações dessa Linha em terra, mar ou no ar, mantendo a paz nas área sensíveis.
  Durante os mais de dez anos da missão, o Brasil contribuiu com efetivo acumulado de aproximadamente 6.300 homens com equipamentos pertencentes ao Exército Brasileiro, divididos em 20 (vinte) contingentes, que se revezavam a cada seis ou sete meses, havendo necessidade, na época, de convocar reservistas e prepará-los para compor os efetivos. O esforço empreendido pela Nação para viabilizar o envio dessa quantidade de militares devidamente equipados e preparados para uma missão de paz numa região tão crítica e afastada do território brasileiro demonstra a grandeza da missão.
    Os relatos históricos e o fato de dois oficiais generais brasileiros terem exercido o comando operacional da UNEF I, nos período de janeiro a agosto de 1964 (General Carlos Paiva Chaves) e de janeiro de 1965 a janeiro de 1966 (General Sizeno Sarmento), comprovam a qualidade e o sucesso dos nossos militares nessa importante e grandiosa missão da ONU.
    A UNEF I foi um exemplo revelador da importância das forças de paz das Nações Unidas, na medida em que pôs fim a uma guerra destrutiva e, por mais de 10 anos, manteve a paz em uma das áreas mais sensíveis do Oriente Médio.
 
Missão de Páz no Timor Leste



A faixa oriental da ilha de Timor foi colonizada pelos portugueses a partir de 1520. A ocidental pelos holandeses, que chegaram à área no século seguinte. Em 1859, Portugal e Holanda firmaram um tratado delimitando a fronteira entre o Timor Português (Timor Leste) e o Timor Holandês (Timor Oeste).
Durante a 2ª Guerra Mundial, o território foi palco de combates entre tropas japonesas e comandos australianos. Quando a Indonésia tornou-se independente, em 1945, anexou a metade holandesa da ilha. O Timor Leste continuou colônia até que a queda do regime de Salazar, a 25 de abril de 1974, levou Portugal a reconhecer o direito à autodeterminação de suas possessões coloniais.
A perspectiva de independência em 1974 levou à criação de partidos políticos agrupados em torno de três idéias básicas. A União Democrática Timorense (UDT) defendia a independência após um longo estágio de autonomia no seio de Portugal.
A Frente Revolucionária do Timor Leste (FRETILIN) lutava por autonomia progressiva até a independência total, a ser alcançada num prazo bem mais curto que o proposto pela UDT. E, finalmente, a Associação Popular Democrática Timorense (APODETI) propunha a integração à Indonésia.
Portugal não conseguiu conciliar as divergências entre as facções. Como resultado, eclodiu a guerra civil no Timor Leste, em agosto de 1975, entre a FRETILIN e os demais grupos. Vencedora do conflito, a FRETILIN proclamou a República Democrática do Timor Leste (RDTL) a 28 de novembro de 1975.
Aproveitando-se do clima de instabilidade, a Indonésia invadiu o território a 07 de dezembro de 1975 e, em 17 de julho de 1976, anexou formalmente a região, integrando-a como sua 27ª província e isolando-a do resto do mundo.
A ONU e Portugal não reconheceram a incorporação. Os grupos pró-independência lideraram a guerra de resistência contra a invasão que se arrastou anos a fio e deixou um doloroso saldo de mais de 200 mil mortos.
Durante muito tempo, o assunto Timor Leste não atraiu a atenção da opinião pública mundial até que, na década passada, alguns fatos contribuíram para jogar os holofotes da comunidade internacional sobre a antiga colônia portuguesa.
O massacre do Cemitério de Santa Cruz, em Dili, capital do Timor Leste, em novembro de 1991, em que as forças de segurança indonésias mataram mais de 200 pessoas, foi o primeiro dos acontecimentos. A concessão do Prêmio Nobel da Paz, em 1996, a dois ativistas do movimento pró-independência, o bispo de Dili, D. Carlos Filipe Ximenes Belo, e o chanceler no exílio do governo do Timor Leste, José Ramos Horta, deu dimensão planetária à luta pela autodeterminação do povo daquele minúsculo território.
Além de conferir maior visibilidade à questão leste-timorense, a premiação daquelas personalidades aumentou a pressão sobre a Indonésia que, sob o peso da crise econômica que assolou países da Ásia no ano seguinte, firmou com Portugal e a ONU o Acordo de 05 de maio de 1999.
O referido acordo estabeleceu a realização de uma consulta popular por meio da qual os leste-timorenses decidiriam o futuro do território ante duas alternativas: autonomia especial, integrado à República Indonésia; ou separação total desse país, com caminho livre rumo à independência. Para conduzir a consulta, foi criada a Missão das Nações Unidas no Timor Leste (UNAMET).
A consulta popular transcorreu no dia 30 de agosto de 1999. Cerca de 98% da população apta a votar exerceram o seu direito. Quatro dias depois saiu o resultado: a causa pró-independência foi a vencedora, obtendo 78,5% dos votos.
O anúncio do resultado da consulta popular desencadeou uma campanha de violência, saque e destruição por todo o território. As ações foram promovidas pelas milícias pró-integração, contando, em algumas oportunidades, com o apoio de elementos das forças indonésias, a quem cabia manter a segurança pública.
Prédios públicos, estabelecimentos comerciais e residências foram incendiados indiscriminadamente. Quase toda a infraestrutura foi posta a pique.
Muitos timorenses, incluindo pelo menos quatro funcionários locais da UNAMET, foram mortos. Mais de 250 mil pessoas tiveram de abandonar suas casas, fugindo para as montanhas ou sendo deportadas para o Timor Oeste. A onda de violência e intimidação também levou à evacuação de jornalistas, observadores internacionais e agentes de assistência humanitária.
A quase totalidade do pessoal da UNAMET teve de ser evacuada para Darwin, na Austrália. No Timor Leste, permaneceram apenas 12 pessoas, trabalhando no quartel-general da missão, que foi transferido para o Consulado australiano em Dili.
A violência sem limites que grassava pelo Timor Leste e o reconhecimento do governo indonésio de sua incapacidade em contê-la levaram a ONU à criação da Força Internacional para o Timor Leste (INTERFET), cuja liderança coube à Austrália. As tropas desembarcaram em Dili a 20 de setembro de 1999, o que forçou as milícias pró-Indonésia a fugir para o lado ocidental da ilha.
A 19 de outubro de 1999, apareceu a primeira sensação de liberdade: o Parlamento indonésio homologou o resultado da consulta popular e anulou o decreto de anexação do Timor Leste. Em seguida, as principais lideranças da causa da independência começaram o regresso à terra natal, após anos de exílio ou de prisão em território indonésio.
Naquela altura, a administração do território estava confiada à Administração de Transição das Nações Unidas no Timor Leste (UNTAET), chefiada pelo brasileiro Sérgio Vieira de Mello. Sob os auspícios da ONU, e dois anos após a votação de agosto de 1999, foi eleita uma Assembléia Constituinte. O pleito acarretou a posse do II Governo de Transição Timorense, liderado por Mari Alkatiri. Em abril de 2002, as eleições presidenciais deram a vitória ao antigo líder do Conselho Nacional da Resistência Timorense, Xanana Gusmão.
No primeiro minuto de 20 de maio de 2002, o mundo acolheu Timor Leste na família das nações independentes. A UNTAET encerrou seus trabalhos e deu lugar à Missão das Nações Unidas de Apoio no Timor Leste (UNMISET), que tem por mandato assistir o governo leste-timorense em setores vitais para sua estabilidade e garantir a segurança interna e externa do país recém-independente.
Dessa forma, um povo orgulhoso e tenaz tornou realidade o sonho de cantar o hino de sua terra, cultuar sua bandeira e viver livre sob um governo que ele mesmo escolheu.
 
MINUSTAH: O BRASIL NA MISSÃO DE PAZ NO HAITI



O Brasil é um dos membros fundadores da Organização das Nações Unidas (ONU) e é conhecido por defender a solução pacífica de conflitos. Seguindo tal princípio, integrar as Missões de Paz da ONU é natural, já que tais operações colocam em prática mecanismos de manutenção e restauração da paz e concordam com o artigo 4º da Constituição Federal. Nessa parte do documento são estabelecidas as diretrizes das relações internacionais brasileiras, o que inclui a defesa da paz, a cooperação entre os povos objetivando o progresso e a já mencionada solução pacífica de conflitos.
O Brasil esteve presente na primeira Missão de Paz da ONU – a Força de Emergência das Nações Unidas (UNEF-1), que em 1948 monitorou a assinatura do Acordo de Armistício entre Israel e seus vizinhos árabes – e desde então participou em mais de 50 dessas operações. O Itamaraty, nosso Ministério das Relações Exteriores, afirma que o Brasil prioriza a participação em operações realizadas “em países com os quais mantemos laços históricos e culturais mais próximos”. Nessa afirmação encaixa-se a Missão de Paz no Haiti – ou MINUSTAH –, que tem importância especial.
O Haiti é um Estado caribenho, que foi a principal colônia francesa das Américas. O país tem uma história importante, mas constantemente ignorada. No Haiti, a libertação dos escravos ocorreu em 1789 – o que só aconteceu no Brasil em 1888 – e a independência foi conquistada em 1804, ao fim da Revolução Haitiana, iniciada em 1791. Após se tornar a primeira república negra das Américas, o país foi obrigado a pagar uma alta indenização à França, que não ficou contente ao perder sua lucrativa colônia. Além disso, o Haiti sofreu com uma ocupação por parte dos Estados Unidos, que durou de 1915 a 1934. Segundo o então presidente dos EUA, Woodrow Wilson, a intervenção objetivava proteger interesses estadunidenses e estrangeiros no local.
Tais fatores têm grande peso sobre a atual miséria política e econômica da nação. O país tem o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) mais baixo das Américas – em 2014 era 0,48 – e o 163º mais baixo no mundo, dentre um total de 186 Estados. No contexto político, o Haiti sofreu com a ditadura de François Duvalier e, posteriormente, de seu filho entre 1957 e 1986. Entretanto, o fim da ditadura não significou o início de uma democracia, já que os militares assumiram o poder e a instabilidade continuou, levando até mesmo a ONU a impor sanções econômicas sobre o Haiti. Em 1990, eleições foram realizadas e o padre Jean-Bertrand Aristide tornou-se presidente. Aristide renunciou ao cargo em 2004, pressionado por protestos populares que deixaram o Estado haitiano à beira de uma guerra civil, já que grupos pró e contra o então presidente enfrentavam-se violentamente. Com a saída de Aristide, o presidente da Suprema Corte do Haiti – Bonifácio Alexandre – assumiu a presidência e solicitou ajuda da ONU. Com a atitude de Alexandre de acionar a ONU, cumpria-se o princípio de “consenso das partes”, necessário para que uma Missão de Paz fosse criada. Assim o Conselho de Segurança definiu o objetivo inicial da MINUSTAH: levar ajuda humanitária e promover a normalidade institucional no país, assim como restabelecer a segurança e proteger os direitos humanos. Além dessas funções, os capacetes azuis – como são conhecidos os soldados das Nações Unidas – auxiliaram no atendimento médico e odontológico, na distribuição de roupas e alimentos e também na manutenção de Desde o início, a MINUSTAH esteve sob o comando brasileiro e assim permaneceu até seu encerramento, mas outros 15 países também integraram a operação. Mesmo com a participação de outros Estados, dados levantados sobre a Missão de Paz mostravam o destaque do Brasil. O artigo “A participação da América Latina e do Caribe nas operações de paz da ONU”, do Instituto Igarapé, aponta que o Brasil foi o país que mais contribuiu com contingente militar. Após o terremoto que atingiu o Haiti em 2010, 2.187 brasileiros estavam no país, o que representava 25,4% do total de tropas da ONU. Ao todo, Ministério da Defesa afirma que 37.449 militares brasileiros participaram da operação – que durou 13 anos e 137 dias
Ao ser formada, previa-se que o fim da MINUSTAH se daria quando suas missões fossem concluídas. Entretanto, imprevistos prolongaram a operação diversas vezes.
 
Terremoto
Em janeiro de 2010, um terremoto causou a morte de mais de 200 mil pessoas e levou o Conselho de Segurança a renovar a MINUSTAH. Assim, as tropas enviadas a mando da ONU poderiam auxiliar na reconstrução do país. O almirante Ademir Sobrinho, chefe do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas, afirmou que:
A partir de 2008, o Haiti estava pacificado. Estávamos prontos pra sair. A ONU já ia encerrar a missão quando houve o terremoto. Aí a missão passou a ter um caráter policial h umanitário. Depois, era necessário realizar as eleições. E elas foram adiadas muitas vezes.
A partir dessa catástrofe, a MINUSTAH aumentou o número de soldados e passou a realizar buscas por sobreviventes, remoção de escombros e corpos, além de distribuir alimentos. Obras de infraestrutura – a qual foi abalada pelo tremor – também foram realizadas.
 
Furacão
Antes mesmo que o Haiti se recuperasse do terremoto, o furacão Matthew – tido como a maior tempestade caribenha em nove anos – arrasou a ilha em outubro de 2016. Mais de um milhão de pessoas foram afetadas e mais de mil foram mortas. A partir de então, a MINUSTAH atuou desobstruindo estradas para possibilitar a passagem de assistência humanitária.
 
Fim da MINUSTAH
Após tantos desastres, o Conselho de Segurança encerrou a Missão de Paz no Haiti. Por meio da Resolução 2350, assinada em abril de 2017, o órgão da ONU estendeu a missão pelos últimos 6 meses, a fim de que a retirada dos capacetes azuis fosse feita gradualmente. O sucesso – e, portanto, o fim da operação – foi atingido com a realização das eleições em 2016, que colocou o empresário Jovenel Moise à frente do governo haitiano. Um relatório feito pela ONU decretou que: O sucesso das eleições e a transição suave de poder a um novo presidente mostram a maturidade das instituições haitianas e o crescente compromisso dos agentes políticos e sociais com a resolução de diferenças pelo diálogo e pelos canais legais. Com o fim da MINUSTAH, foi realizada a criação da Missão das Nações Unidas de Apoio à Justiça no Haiti (MINUJUSTH). Diferentemente da MINUSTAH, a MINUJUSTH não é uma Missão de Paz e, portanto, não conta com contingente militar. Formada por civis e unidades de polícia, sua missão é consolidar o processo de fortalecimento das instituições públicas haitianas, assim como o cumprimento do Estado de Direito no país.
 
CRÍTICAS À MINUSTAH
Deve-se destacar que, apesar de Bonifácio Alexandre ter recorrido à ajuda da ONU, nem todos os haitianos viam a Missão de Paz no Haiti com bons olhos.
Organizações e cidadãos consideravam a operação como uma nova ocupação militar estrangeira disfarçada de ajuda humanitária. O fato de entidades controlarem, em nome das Nações Unidas, os recursos financeiros enviados ao Haiti era criticado. Mesmo tendo como justificativa evitar que tal dinheiro fosse desviado pelos políticos, a ação era vista como uma forma de ferir a soberania do país, deixando-o impossibilitado de tomar suas próprias decisões.
Intervenção federal ou intervenção militar?
Em 2011, soldados brasileiros foram investigados ao serem acusados de agredir três jovens haitianos. Diversas também foram as denúncias de estupro e abusos por parte de capacetes azuis, que chegavam a oferecer alimentos em troca de sexo. Uma reportagem do Estadão aponta que, entre 2004 e 2016, a ONU registrou 150 denúncias de abuso sexual contras soldados estrangeiros atuando na MINUSTAH, incluindo brasileiros, nigerianos, uruguaios e paquistaneses. Rosilene Wansetto, coordenadora da Rede Jubileu Sul, afirmou que “o fim da MINUSTAH já vem tarde. Há várias denúncias neste sentido de mulheres violentadas ou levadas à prostituição. Inclusive há filhos de agentes da força de paz não reconhecidos”.
 
Cólera
Também em 2010, logo após o terremoto, um surto de cólera se espalhou pelo Haiti. Uma investigação da ONU apontou que a doença – que causou 4,5 mil mortes – fora trazida ao país por tropas do Nepal. A mesma investigação indicou falhas nas condições de saneamento dos acampamentos da MINUSTAH, que permitiram que o principal rio da região fosse contaminado. A participação do Brasil na Missão de Paz no Haiti foi fundamental. Além dos 37 mil soldados enviados ao Haiti, o governo brasileiro gastou cerca de R$2,5 bilhões. Desse valor, R$930 milhões foram ressarcidos pela ONU. Todo esse dinheiro colocado na Missão de Paz faz muita gente se questionar sobre a validade da participação brasileira, já que o país poderia ter investido tal quantia em seu próprio território.
Aceitar coordenar a MINUSTAH, assim como participar de outras Missões de Paz, é uma maneira de o Brasil ampliar seu peso e sua atuação na Comunidade Internacional. Mostrando sua relevância na América Latina e no Caribe, o Brasil fortalece sua campanha em busca de um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU – uma colocação reservada aos principais países do mundo. Para Eduarda Hamann, pesquisadora do Instituto Igarapé, do ponto de vista diplomático, a MINUSTAH foi importante para melhorar a posição brasileira no contexto internacional. Para ela, “em grande medida por causa da missão, o Brasil foi eleito como membro não permanente do Conselho de Segurança da ONU para o biênio 2010-2011”.
Somado aos ganhos da política externa brasileira está o fato de a MINUSTAH ter preparado as Forças Armadas brasileiras para agir em diversos contextos – como em conflitos civis e desastres naturais – , enriquecendo seu treinamento.
 
HAITIANOS NO BRASIL
Pode-se relacionar a participação brasileira na MINUSTAH com o fluxo migratório de haitianos recebido na segunda década do século XXI. Tobias Metzner, autor de La Migración Haitiana Hacia Brasil resumiu essa correlação na seguinte afirmação:
Destaca-se que há pouca informação objetiva ao alcance dos migrantes haitianos. A maior parte da mesma, no que se refere às condições de vida no Brasil, provém dos retratos que fazem os meios de comunicação de massa, não são numerosos e usualmente estão baseados nos esportes, rumores propagados por traficantes, e o boca a boca anedótico através da Construtora OAS, companhia brasileira que construiu várias estradas na metade sul do país, e o Batalhão Brasileiro Minustah. Há uma compreensão generalizada de que existem oportunidades laborais [de trabahlo] no Brasil para trabalhadores não qualificados, os vistos são relativamente fáceis de obter e a suposição de que o Brasil não deporta aos migrantes irregulares.
Ações simbólicas também tiveram impacto na visão da população haitiana sobre o Brasil. Logo após a chegada das tropas para a Missão de Paz no Haiti, em 2004, realizou-se uma partida amistosa conhecida como “Jogo Pela Paz”. Com objetivo de conquistar a simpatia dos cidadãos locais, o jogo contou com a participação de Ronaldinho Gaúcho e Ronaldo Fenômeno. Além disso, ao visitar o Haiti em fevereiro de 2010, o ex-presidente Lula afirmou em seu discurso que o povo haitiano seria bem vindo ao Brasil.
Durante o fluxo migratório vindo do Haiti, o Chile e a Argentina também foram destinos objetivados. Entretanto, como aponta uma pesquisa da Organização Internacional para as Migrações (OIM) e do Instituto de Políticas Públicas em Direitos Humanos (IPPDH) do Mercosul, o Brasil foi o país sul-americano que mais recebeu esses imigrantes. Até o fim de 2016, 67 mil autorizações de residência foram emitidas para haitianos. Esses estrangeiros também se depararam uma característica negativa brasileira: a xenofobia.
Uma pesquisa publicada em 2016 pelo programa Cidade e Alteridade da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) confirmou isso. Ao entrevistar haitianos residentes na região metropolitana de Belo Horizonte, descobriu-se que 60% dos homens haitianos entrevistados sofrem de xenofobia e outros tipos de preconceito no local de trabalho. Em relação às mulheres entrevistadas, esse número atinge os 100%.
Saber sobre os motivos que levam o Brasil a participar de Missões de Paz e também sobre as consequências dessa participação é fundamental para que os cidadãos entendam a questão e possam opinar. O fluxo migratório de haitianos, por exemplo, é uma consequência da MINUSTAH que mostra a realidade brasileira sobre a xenofobia. Ter essa consciência permite pensar em políticas públicas para enfrentar esse preconceito, de forma a transformar em realidade os princípios democráticos e humanitários defendidos tanto pelo Brasil quanto pela ONU.\
 
Fonte Site exercito Brasileiro

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